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10/06/2016

Leitura espiritual

Leitura Espiritual

INTRODUÇÃO AO CRISTIANISMO

"Creio em Deus" – Hoje

SEGUNDA PARTE

JESUS CRISTO

CAPÍTULO PRIMEIRO

"Creio em Jesus Cristo seu Filho Unigénito, Nosso Senhor".

IV. Caminhos da Cristologia

6. O primado da aceitação e a positividade cristã.

O homem é salvo pela cruz; o Crucificado, como o totalmente aberto, é a verdadeira salvação do homem – já noutro contexto nos esforçamos por tornar compreensível à inteligência de hoje essa verdade da fé. Consideremo-lo agora, não no seu conteúdo, mas na sua estrutura: esta exprime uma primazia da aceitação sobre a acção, sobre a própria atuacção, quando se trata do elemento decisivo do homem. Talvez tenhamos aqui o ponto mais profundo da divisão entre o princípio cristão da esperança e a sua contrafacção marxista. Certamente, também o princípio marxista baseia-se numa ideia de passividade, porquanto, de acordo com ele, o proletariado sofredor é o salvador do mundo. Mas um tal sofrimento do proletariado, destinado, por fim, a concretizar a transformação numa sociedade sem classes, de facto, há de realizar-se mediante uma luta activa de classes. Só assim o proletariado pode tornar-se "salvador", conduzindo ao desarmamento da classe dominante e à igualdade de todos os homens. Se a cruz de Cristo é um sofrimento "para", a paixão do proletariado, vista marxisticamente, efectua-se como luta "contra"; se a cruz é essencialmente obra de um indivíduo em prol da colectividade, a paixão proletária é essencialmente obra da massa, organizada em partido para seu próprio benefício. Portanto, ambos os caminhos correm em direcções opostas, apesar de um ponto de contacto nos seus pontos de partida.

Por conseguinte, sob o ponto de vista cristão, o homem não se alcança a si mesmo pelo que faz, mas pelo que recebe. Cumpre-lhe aguardar o dom do amor, e amor não se recebe de outra forma senão como dádiva. Ninguém está em condições de "produzi-lo" por si, sem o outro; deve-se esperá-lo, aceitá-lo como presente. E ninguém pode tornar-se completamente homem, senão sendo amado, deixando-se amar. O amor do homem representa, ao mesmo tempo, a mais alta possibilidade e a necessidade mais profunda, sendo esta necessidade simultaneamente o que há de mais livre e de menos forçado, tendo como consequência depender o homem da sua aceitação para ser "salvo". Recusando uma tal mercê, o homem destrói-se a si mesmo. Uma actividade que se sustente de modo absoluto, que queira realizar o ser-homem por si mesma; com os próprios recursos, representa contradição em sua natureza. Louis Evely formulou magnificamente esse ponto de vista da seguinte forma:

"A história da humanidade desencaminhava-se, sofreu uma fractura por causa da falsa ideia de Deus em Adão. Este quis ser como Deus. Espero que nunca tenhais visto neste ponto o pecado de Adão... Deus não o aliciava a ser como ele? Adão enganou-se apenas no protótipo. Acreditava ser Deus um ser independente, autónomo, a bastar-se a si mesmo; e, a fim de tornar-se como ele, revoltou-se, mostrando-se desobediente.

Mas, ao mostrar-se como era, Deus revelou-se como amor, ternura, transbordamento de si mesmo, como infinita complacência num outro. Afeição, dependência. Deus mostrou-se obediente, obediente até à morte.

Crendo tornar-se Deus, Adão desviou-se totalmente dele. Retraiu-se à solidão, enquanto Deus era comunhão".

Sem dúvida, tudo isto significa uma relativização das ações, da actividade; a luta de S. Paulo contra a "justiça das obras" deve ser compreendida sob este ângulo. Contudo, é mister acrescentar que, nessa ordenação da actividade humana como grandeza penúltima apenas, está incluída a sua libertação interna: a actividade do homem pode desdobrar-se na serenidade, no desprendimento, na liberdade peculiar àquilo que é penúltimo. O primado do receber de modo algum pretende confinar o homem à passividade; não significa que ao homem bastaria cruzar os braços, como o marxismo nos argui. Pelo contrário: esse primado possibilita realizar as tarefas deste mundo, colocando-as a serviço do amor redentor, em espírito de responsabilidade e, ao mesmo tempo, sem inibição e com alegre liberdade.

Deste ponto de partida ainda flui outra consequência. O primado do receber inclui a positividade cristã, comprovando a sua necessidade intrínseca. Constatamos que o homem não coloca por si o que é decisivo; esse primado há de sobreviver-lhe não como feito por ele, não como produto seu, mas como um livre correlativo a – doar-se-lhe. Sendo assim, segue-se que, em última análise, a nossa relação com Deus não pode basear-se em nosso próprio roteiro, num conhecimento especulativo, mas há de exigir a positividade do que nos está à frente, que nos sobrevém como algo positivo, como algo a ser recebido. A meu ver, partindo daqui, poderia realizar-se, por assim dizer, a – quadratura do Círculo da Teologia, a saber, a interna necessidade da aparente contingência histórica do crístico, o "deve" da sua chocante positividade como um acontecimento que vem de fora. Pode ser superada aqui a antítese tão acentuada por Lessing entre vérité de fait (verdade fortuita dos factos) e vérité de raison (verdade necessária da razão). O casual, o exterior é o necessário ao homem; só pelo sobrevir de fora se lhe abre o íntimo, O incógnito de Deus enquanto homem na história "deve" ser com a necessidade da liberdade.

7. Síntese: a "essência do cristianismo".

Resumindo tudo, podemos dizer que os seis princípios que tentamos apresentar esquematicamente podem-se chamar como que a fórmula arquitectónica da existência cristã, como a fórmula para a "essência do cristianismo". Por meio deles também poderia ser retratado aquilo que denominamos a pretensão cristã absolutista, usando de um termo bastante ambíguo. O que ele significa revela-se sobretudo no princípio "indivíduo", no princípio "para", no princípio sobre o "definitivo" e no da "positividade". Nestes princípios básicos aparece a maneira peculiar da pretensão que a fé cristã apresenta e deve fazer valer frente à história das religiões, se quer conservar-se fiel a si mesma.

Resta, porém, ainda uma pergunta: Tendo diante de si os seis princípios, como os analisamos, pareceria sem complicação a nossa sorte, tal como a dos físicos a buscarem a origem da matéria do ser, julgando tê-la identificado nos chamados elementos. Mas, quanto mais pesquisavam, mais elementos se tornavam conhecidos; hoje o seu número ultrapassa a casa dos cem. Esses elementos não podiam ser o último, que, a seguir, se julgou ter descoberto nos átomos. Mas estes, por sua vez, também mostraram ser compostos de partículas elementares, cujo número actualmente é tão elevado que não é mais possível deter-se neles, mas se impõe nova arrancada para, talvez, encontrar finalmente a matéria original. Nos seis princípios encontramos como que as partículas elementares do crístico, mas, não haveria, por trás deles, um núcleo único, simples, como que o germe do cristianismo? Há, e creio que, – após o que se disse – sem perigo de estar formulando uma simples frase sentimental, podemos afirmar que os seis princípios, em última análise, se concentram no único e uno princípio do amor. Digamo-lo grosseiramente e até com equívocos: não é verdadeiro cristão o membro confessional do partido, mas aquele que se tornou realmente humano pela sua vivência cristã. Não aquele que observa de maneira servil um sistema de normas e de leis, apenas com vistas para si mesmo, mas aquele que se tornou livre para a simples humana bondade. Certamente, para ser autêntico, o princípio "amor" há-de incluir a fé. Somente assim se conserva o que é. Porque sem a fé, que aprendemos a encarar como expressão de uma derradeira necessidade humana de receber e da insuficiência de todas as próprias realizações, o amor não passará de acção arbitrária. O amor assim, elimina-se, transformando-se em auto-justiça: fé e amor condicionam-se mutuamente. Desta forma deve acrescentar-se que no princípio "amor" está presente o princípio "esperança" que busca o todo, ultrapassando o instante e o seu parcelamento. Portanto, a nossa análise conduz-nos de per si às palavras com que S. Paulo indica as colunas mestras do Cristianismo: "Agora estas três coisas são constantes: a fé, a esperança, a caridade; mas a maior delas é a caridade" (1Cor 13,33).

joseph ratzinger, Tübingen, verão de 1967.

(Revisão da versão portuguesa por ama)






Pequena agenda do cristão


Sexta-Feira


(Coisas muito simples, curtas, objectivas)


Propósito:

Contenção; alguma privação; ser humilde.


Senhor: Ajuda-me a ser contido, a privar-me de algo por pouco que seja, a ser humilde. Sou formado por este barro duro e seco que é o meu carácter, mas não Te importes, Senhor, não Te importes com este barro que não vale nada. Parte-o, esfrangalha-o nas Tuas mãos amorosas e, estou certo, daí sairá algo que se possa - que Tu possas - aproveitar. Não dês importância à minha prosápia, à minha vaidade, ao meu desejo incontido de protagonismo e evidência. Não sei nada, não posso nada, não tenho nada, não valho nada, não sou absolutamente nada.

Lembrar-me:
Filiação divina.

Ser Teu filho Senhor! De tal modo desejo que esta realidade tome posse de mim, que me entrego totalmente nas Tuas mãos amorosas de Pai misericordioso, e embora não saiba bem para que me queres, para que queres como filho a alguém como eu, entrego-me confiante que me conheces profundamente, com todos os meus defeitos e pequenas virtudes e é assim, e não de outro modo, que me queres ao pé de Ti. Não me afastes, Senhor. Eu sei que Tu não me afastarás nunca. Peço-Te que não permitas que alguma vez, nem por breves instantes, seja eu a afastar-me de Ti.

Pequeno exame:

Cumpri o propósito que me propus ontem?



Reflexão no Ano Jubilar da Misericórdia - Exemplo

Resultado de imagem para exemploEXEMPLO

Todos, mais ou menos, sabemos as obras de misericórdia mais comuns e que constam das enumeradas pela Igreja.

Mas há muitas mais que se confinam a cada um de nós que talvez não tenhamos oportunidade de vestir, alimentar, acompanhar quem necessite.

Depende, obviamente, das condições particulares de cada um mas há algo que todos seja qual for o nosso estado, situação ou circunstâncias podemos - e devemos, acrescentaria - fazer e que é seguramente uma excelente obra de misericórdia: o EXEMPLO!

A ajuda, solidariedade, interesse, preocupação com os outros podem consumar-se no exemplo que damos a respeito da nossa vida, como a encaramos, como a "levamos", como superamos as revezes, as contradições, a inquietação, suportamos a doença, o mal-estar.

Como nos empenhamos no que fazemos, as nossas obrigações e deveres.

O exemplo que dermos em todas estas situações pode ajudar de facto muitos!

Então, o exemplo, não é uma obra de misericórdia?


ama, 2016.04,18

Doutrina – 170

CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA

Compêndio


PRIMEIRA PARTE: A PROFISSÃO DA FÉ
SEGUNDA SECÇÃO: A PROFISSÃO DA FÉ CRISTÃ
CAPÍTULO PRIMEIRO CREIO EM DEUS PAI

A queda

74. O que é a queda dos anjos?


Com esta expressão indica-se que Satanás e os outros demónios de que falam a Sagrada Escritura e a Tradição da Igreja, de anjos criados bons por Deus, se transformaram em maus, porque, mediante uma opção livre e irrevogável, recusaram Deus e o seu Reino, dando assim origem ao inferno. Procuram associar o homem à sua rebelião contra Deus; mas Deus afirma em Cristo a Sua vitória segura sobre o Maligno.

Tu... soberba? – De quê?

Tu... soberba? – De quê? (Caminho, 600)

Quando o orgulho se apodera da alma, não é estranho que atrás dele, como pela arreata, venham todos os vícios: a avareza, as intemperanças, a inveja, a injustiça. O soberbo procura inutilmente arrancar Deus – que é misericordioso com todas as criaturas – do seu trono para se colocar lá ele, que actua com entranhas de crueldade.

Temos de pedir ao Senhor que não nos deixe cair nesta tentação. A soberba é o pior dos pecados e o mais ridículo. Se consegue atormentar alguém com as suas múltiplas alucinações, a pessoa atacada veste-se de aparências, enche-se de vazio, envaidece-se como o sapo da fábula, que inchava o papo, cheio de presunção, até que rebentou. A soberba é desagradável, mesmo humanamente, porque o que se considera superior a todos e a tudo está continuamente a contemplar-se a si mesmo e a desprezar os outros, que lhe pagam na mesma moeda, rindo-se da sua fatuidade. (Amigos de Deus, 100)


Leitura espiritual

Leitura Espiritual

INTRODUÇÃO AO CRISTIANISMO

"Creio em Deus" – Hoje

SEGUNDA PARTE

JESUS CRISTO

CAPÍTULO PRIMEIRO

"Creio em Jesus Cristo seu Filho Unigénito, Nosso Senhor".

IV. Caminhos da Cristologia

4. A lei do supérfluo.

Sob o ponto de vista do Novo Testamento, o tema da "superabundância" conduz ainda a outra senda, na qual finalmente o seu sentido fica inteiramente esclarecido. Encontramos a palavra outra vez em nexo com o milagre da multiplicação dos pães, onde se fala de uma "sobra" de sete cestos (Mc 8,8). Pertence à essência da narração da multiplicação dos pães o despertar a atenção para a ideia e a realidade do supérfluo, do mais-que-necessário. E acorre imediatamente à lembrança o milagre parecido, da transformação da água em vinho nas bodas de Caná (Jo 2,1-11). É verdade que a palavra "sobra" ou "abundância" não ocorre, tanto mais porém a coisa: o vinho conseguido pela transformação da água, de acordo com o que informa o Evangelho, chega a uma quantidade fora do comum para uma festa familiar: 480 a 700 litros. Ora, na intenção dos evangelistas, ambas as narrações têm nexo com a forma central do culto cristão, a Eucaristia. Apontam para ela como a superabundância divina, que ultrapassa infinitamente todas as necessidades e tudo que se possa desejar razoavelmente.

Mas ambos os eventos, pela sua relação com a Eucaristia, têm nexo com Cristo e apontam para ele, em última instância: Cristo é a infinita auto-prodigalidade de Deus. E, como aliás o constatamos no estudo do princípio "para", ambos apontam para a lei estrutural da criação onde a vida esbanja milhões de germes para salvar um ser vivo, onde um universo inteiro é esbanjado para preparar, num ponto, o lugar para o espírito, o homem. Superabundância é a marca de Deus na criação; pois "Deus não calcula seus dons sob medida", como afirma a Patrística. Mas, super-abundância também é a razão exacta e a forma da história da salvação, que, afinal, nada mais é do que o acontecimento realmente estonteante de Deus a entregar não só um universo, mas a si mesmo, em incompreensível auto-esbanjamento, com o fito de conduzir ao porto da salvação o grão de poeira chamado homem. Repitamo-lo: portanto, super-abundância é a definição exacta da história da salvação. A inteligência meramente calculista eternamente achará absurdo que Deus deva gastar-se para o homem. Só quem ama é capaz de compreender a loucura de um amor, para o qual esbanjamento é lei, super-abundância – o único que satisfaz. Contudo, se é verdade que a criação vive da super-abundância; que o homem é aquele ser para o qual o super-abundante representa o necessário, como admirar-se que revelação é o suficiente, e, por isto, o necessário, o divino, o amor, no qual se realiza o sentido do universo?

5. O definitivo e a esperança.

A fé cristã ensina que em Cristo se realizou a salvação dos homens, que nele se iniciou irrevogavelmente o futuro do homem, e assim, embora permanecendo futuro, é contudo, perfeito, parcela do nosso presente. Esta declaração inclui um princípio do "definitivo", de máxima importância para a forma da existência cristã, respectivamente para a maneira da opção existencial incluída no ser-cristão. Tentemos elaborá-lo mais exactamente. Acabamos de constatar ser Cristo o futuro iniciado, a já aberta fase definitiva do homem. Na linguagem escolástica este pensamento foi expresso, ao ser afirmado que, com Cristo, a revelação estava terminada. Naturalmente, isto não pode significar que determinado número de verdades tenha sido comunicado, resolvendo Deus não acrescentar ulteriores comunicações. Significa, antes, que o diálogo de Deus com o homem alcançou o fim colimado, no compromisso de Deus com a humanidade em Cristo, o homem que é Deus. Neste diálogo não se tratava, nem se trata de dizer alguma coisa ou muita coisa, mas de dizer-se a si mesmo na Palavra, no Verbo. Assim a sua intenção não alcança a meta pelo facto de haver uma comunicação do maior número possível de conhecimentos, mas sim quando, mediante a palavra, o amor se torna visível, tocando-se o tu com o tu na palavra. O seu sentido não está em um terceiro, num contendor, mas no próprio parceiro e chama-se união. Ora, no homem Jesus, Deus se disse a si mesmo definitivamente. Jesus é a sua palavra e, como tal, é o próprio Deus. A revelação não termina aqui porque Deus a encerre positivamente, mas porque chegou à sua meta, ou, como o exprime Karl Rahner: "Nada se diz de novo, não por haver muito ainda a dizer, mas porque tudo foi dito, tudo foi doado no Filho do amor, no qual Deus e mundo se tornam um"..

Mas, consideremos o assunto mais de perto. Eis o que se nos revela: Cristo alcançou a meta da Revelação e, com ela, o ponto final da humanidade, porque nele se tocam e se unem divindade e humanidade; isto significa, ao mesmo tempo, que o alvo alcançado não representa um limite rígido e fixo, mas um espaço aberto. Pois a união acontecida naquele ponto único chamado Jesus de Nazaré deve atingir a humanidade inteira, o único "Adão" todo, transformando-o em "Corpo de Cristo". Enquanto essa totalidade não for alcançada, enquanto ela se conservar limitada a um ponto, o acontecido em Cristo continuará sendo ao mesmo tempo fim e começo. A humanidade não pode avançar mais longe e mais alto do que Cristo, porque Deus é o mais distante e o mais sublime; qualquer aparente progresso para além dele denota uma queda no vazio. A humanidade não pode ultrapassá-lo – neste sentido, Cristo é o fim; mas ela deve entrar nele – neste sentido, Cristo é o começo real.

Não nos é preciso reflectir sobre o entrelaçamento de passado e futuro, consequência para a consciência cristã; nem é mister pensar que de acordo com isto, a fé cristã, voltada para o Jesus histórico, está orientada para o futuro, para o novo Adão – sobre o qual se concentra o futuro, O mundo e o homem, sob o ponto de vista de Deus. Já falamos antes sobre isto tudo. Aqui trata-se de outra coisa. O facto de já ter sido feita a decisiva determinação de Deus a respeito do homem denota existir o elemento definitivo na história – no enfoque da fé – mesmo se a feitura do definitivo for tal que não exclua o futuro, mas o abra. Consequência disto, por sua vez, é a necessária existência do definitivo, do irrevogável também na vida do homem, sobretudo onde o homem encontra o definitivo divino do qual acabamos de tratar. A confiança na existência do definitivo, exactamente como garantia aberta do futuro do homem, caracteriza a posição cristã total face à realidade: para o cristão não satisfaz nem serve o circunvolver do actualismo que enfrenta tão somente cada momento presente, sem jamais encontrar o definitivo. O cristão tem certeza de que a história avança; ora, avanço, progresso exige o definitivo da direcção – eis o que distingue o cristão do movimento em círculo, que não leva a lado nenhum. A luta pela irrevogabilidade do crístico foi travada na Idade Média enquanto luta contra o "terceiro reino": após o "reino do Pai" corporificado no Antigo Testamento, seguiu-se o segundo reino, concretizado no Cristianismo, ou seja, o reino do Filho, superior ao primeiro, mas que, por sua vez, seria substituído pelo terceiro reino: a era do Espírito. A fé na encarnação de Deus em Jesus Cristo não admite nenhum "terceiro reino", porque acredita no estado definitivo do acontecido, sabendo-se, exactamente por isto, aberta para o futuro.

Já aludimos ao facto de aí se acharem inclusas consequências decisivas também para a vida do indivíduo: a fé reivindica definitivamente o homem, não podendo ser substituída após o reino do Pai, na infância, e o do Filho, na juventude, por uma era esclarecida do Espírito, que só obedeça à própria razão a entregar-se, subrepticiamente, ao Espírito Santo. Certamente, a fé tem as suas épocas e gradações, mas precisamente com isto ela representa o fundamento durável da existência do homem que é um apenas. É por este motivo que a fé tem expressões definitivas – dogma, símbolo – nas quais se articula o seu aspecto definitivo interno. Isto, porém, não quer dizer que tais formas não sejam susceptíveis de um subsequente abrir-se na história, sendo re-compreendidas, do mesmo modo como o indivíduo deve aprender a interpretar a fé, sempre de novo dentro das vicissitudes da sua vida. E isto quer dizer que, dentro desse processo de compreensão e de amadurecimento, não pode nem deve ser eliminada a unidade do objecto compreendido.

Finalmente poderíamos mostrar que o aspecto definitivo da união de dois seres humanos, que a fé vê estabelecida pelo "sim" do amor, fundamento do matrimónio – que também este aspecto definitivo está enraizado aqui. De facto, o casamento indissolúvel só é compreensível e realizável pela fé na indestrutível decisão de Deus em Cristo, mediante o "matrimónio" ou as "núpcias" com a humanidade (cfr. Ef 5,22-33). O matrimónio subsiste ou cai com esta fé; fora dela, ele é tão impossível, como dentro da fé é necessário. Novamente caberia dizer que esta aparente fixação sobre a decisão de um momento na vida possibilita ao homem o progresso, a subida de grau em grau, enquanto a contínua anulação de tais decisões o lança continuamente de volta ao começo, condenando-o a girar em círculo que se encerra na ficção da eterna juventude, recusando-se assim ao conjunto da existência humana.

joseph ratzinger, Tübingen, verão de 1967.

(Revisão da versão portuguesa por ama)



Evangelho e comentário


Tempo Comum

Anjo da Guarda de Portugal

Evangelho: Lc 2, 8-14

8 Naquela mesma região, havia uns pastores que velavam e faziam de noite a guarda ao seu rebanho. 9 Apareceu-lhes um anjo do Senhor e a glória do Senhor os envolveu com a sua luz e tiveram grande temor. 10 Porém, o anjo disse-lhes: «Não temais, porque vos anuncio uma boa nova, que será de grande alegria para todo o povo: 11 Nasceu-vos hoje na cidade de David um Salvador, que é o Cristo, o Senhor. 12 Eis o que vos servirá de sinal: Encontrareis um Menino envolto em panos e deitado numa manjedoura». 13 E subitamente apareceu com o anjo uma multidão da milícia celeste louvando a Deus e dizendo: 14 «Glória a Deus no mais alto dos céus, e paz na terra aos homens, objecto da boa vontade de Deus».

Comentário:

Sei, tenho a certeza absoluta, que o Anjo da minha guarda está presente junto de mim em todos os momentos da minha vida, esteja eu onde estiver, faça o que fizer.

A sua presença é mais que uma “assistência” pessoal de altíssimo valor é, antes de mais, uma disponibilidade de um Espírito Puro que contempla a Face do Criador perante o qual há-de comparecer acompanhando-me no dia do meu juízo particular.

É esta assistência e esta disponibilidade que me tranquilizam e me dão uma enorme paz interior porque sendo o que sou e como sou, o Senhor que me mantém vivo quer que não esteja sozinho mas que tenha um dos Seus Anjos para me acompanhar, assistir e guiar.

(ama, comentário sobre Lc 2, 8-14, 2015.06.10)